Tavira à Luz do Poente

Dezembro 26, 2021

Tavira à Luz do Poente

Agosto!

Esbraseia-me o rosto

A chama do sol posto.

 

A terra arde lá p´ra o ocidente,

Clarão!

Já todo o horizonte é sangue ardente,

Vencendo o azul do céu por mais potente,

Queimando as brancas nuvens em zarcão.

 

No céu

O vivo fogaréu

Alastra de escarcéu.

 

Por trás do S. Miguel, que vulcão!

Jesus!…

Na contra luz o cerro é um carvão,

Faz frente ao fogo, agarra-se ao chão,

E a crista em ala viva é toda luz!

 

A serra

Vencida, foge à guerra

Do incêndio que a aterra…

 

Dos roxos montes de Santa Maria,

Largar!

Altos e baixos, toda a serrania,

Debanda para a frente em correria

Na esp´rança de poder chegar ao mar.

 

A ria,

Que pouco a pouco enchia,

O incêndio a divertia.

O vermelhão da c´roa do poente,

Tesouro!

No ondear punha anéis de serpente,

De fogo de magia, não ardente,

E os peixes que saltavam eram de ouro.

 

Da Ilha

Diviso a maravilha

Da cidade, na milha.

 

P´las baixas ou colinas altaneiras,

Zimbórios!

Doiradas torres da fé mensageiras

Leve tilintam vésp´ras nas sineiras,

Quais relíquias saídas de cibórios!

 

Que luz!…

De mística conduz

À dos braços da Cruz.

 

E as sombras, aos contrastes, às chapadas

De cal

Do casario, em brincadeira p´las colinas,

De tombo em tombo acabam derrotadas

Nas pirâmides egípcias de sal.

 

Jardins!

Suspensos de jasmins

Sinoplas e carmins!

 

Verdes e sombras vão banhar-se ao rio,

Fulgores!

Heráldicas palmeiras no rossio

Emprestam dignidade ao ingresio

Das flores e dos pardais aos pescadores.

 

Gaivotas,

Em elegantes rotas,

Enfloram galeotas.

 

Gaivinas em chilreio cruzam a ponte

No ar…

As lavadeiras batem lá p´ra fonte,

Um rebanhito desce pelo monte,

E as mães dos moços chamam p´ra jantar.

 

Que paz!…

Que sossego nos traz!

Como isto nos apraz!…

 

O sonho oriental revive a doura,

Magia!

Mirantes e telhados de tesoura…

Por trás das reixas estão olhos de moura…

…E encantamentos há em cada dia!

 

Que belos

Mosteiros e castelos!

Como custa já vê-los…

 

Cobriam tudo as dobras da noitinha…

Miragem?

Teria tudo sido ilusão minha?

– É Tavira.- Me disse alguém que vinha.

…E deixei-me ficar em homenagem.

                                                                            

Sebastião Leiria 

18 de Agosto de 1971